Léo Daniel

Amar é servir. Servir é ser livre para Amar.

Textos

O dono da bola
JORNAL “O IMPARCIAL” - ARARAQUARA/SP
COLUNA “O CONTADOR DE HISTÓRIAS”
LEONARDO DANIEL RIBEIRO BORGES
TEXTO 16 (QUARTO DE MARÇO)


O dono da bola

Quando iniciei a coluna desta semana, não sabia se
escreveria uma crônica contando algo que realmente me
ocorreu, ou se meu enfoque descansaria numa narrativa
percrustada somente pelo poder da criação. Agora me
vem outra dúvida, se, simplesmente, continuo este
diálogo do qual certamente você, meu leitor é o
interlocutor.
Na vida muitas vezes temos que viver diferentes
papéis, saber jogar conforme as regras do jogo, sem
fazer disso algo enfadonho, sem perder na noite o
precioso sono. Você já pensou que o belo pertence à
humanidade? Que a humanidade pertence ao que é belo?
Que toda vez que vê algo bonito e sente no íntimo que
já o tinha visto, e que parece que aquilo foi você
mesmo que fez, pensou, sentiu, viveu... Foi isso que
Sócrates chamou de reminiscência dos conhecimentos das
almas, base da sua maiêutica filosófica.
Para Sócrates, todos nós trazemos uma recordação dos
mundos metafísicos, espirituais, de onde viemos, e a
beleza é a expressão máxima dessa recordação, conforme
a afinidade das almas com determinados deuses, cria-se
o desejo de reaproximação aqui no mundo físico. No
“Diálogo de Fedro” conta-nos Platão que os Deuses
seguem no infinito com seus pares de cavalos invictos,
os mortais vão atrás dos deuses com um cavalo bom e
outro coxo, não alcançam os deuses, porém, podem ser
felizes pela jornada. Cada Deus tem sua arte
específica, cada mortal é um aprendiz de tal arte.
Toda vez que lemos algo e sabemos, é porque já
sabíamos, apenas recordamos o que é de fato esse algo,
a sabedoria não consiste em dizer o diferente, mas
dizer o mesmo com a novidade de cada instante.
Para Sócrates todo espírito liberto é dono da bola é
dono do jogo, a maiêutica consiste no fato de abrir os
olhos sentir a bola no pé e chutar livremente pro gol,
a maiêutica é uma goleada na ignorância, e esses gols,
essas vitórias não são “dos técnicos”, “não são dos
mestres”, você que chutou. O mestre, o filósofo te
preparou impendido que você preconcebesse algum
preparo que não fosse o vazio que ilumina. O jogo não
termina, o jogo só acaba de começar.
Quando era criança, ganhei uma bola de futebol de
capotão, ela era azul e branca, era muito dura, mas
não muito pesada, logo tive que ser duro para lhe dar
com ela, na infância não fui bom jogador de futebol,
gostava mais de artes marciais, mas,jogava com meus
irmãos Paulo, Marcelo, João, sobrinhos, amigos e
inimigos. É engraçado como os inimigos passam a ser
amigos quando as brigas acabam em empate, e depois, a
luta do dia a dia, a luta da sobrevivência que é o
maior embate, o mundo adulto é estranho quase ninguém
é amigo de verdade e também quase ninguém tem inimigos
de verdade.
Hoje entendo que ser dono da bola é mais do que ser
capitão do time, ou nunca ficar na reserva, hoje
entendo que ser dono da bola é ser um atleta na
ciência do autoconhecimento sentir-se muito amado por
um pai que retribui as boas ações do filho, com uma
bola que é o mundo...
Na matriz de Araraquara tem o maior painel religioso
do país, “O CRISTO REI”, nele há o desenho do Filho
muito amado de Deus, com um cajado na mão direita e na
destra, junto ao corpo e sob o braço ele carrega um
planeta.
A bola e o seu dono permitem o jogo, querem a
brincadeira, a bola e o seu dono se satisfazem de
alegria e distraem a tristeza, não há nada mais sério
do que uma criança e sua bola sob os braços -
preparada para a vida, livre para amar, e jogar com
alma o que lhe dá a salvação.


Leonardo Daniel R. Borges*
leodanielrb@yahoo.com.br
*Leonardo é poeta, professor e contador de histórias


Leonardo Daniel
Enviado por Leonardo Daniel em 16/11/2020


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